domingo, 21 de agosto de 2016

ÚLTIMO DESEJO

Venham,
abandonem os carros no acostamento
e nas calçadas, atirem os dentes
e as carteiras no lixo, lamento
e delírio arrombem os cemitérios,
meu corpo permanecerá inerte
alegremente defunto

Meus olhos sirvam de lagoas podres
às borboletas, troquei a estrada
pela sombra, que o meu sangue
alimente os porres loucos dos mendigos
cansei de equilibrar na cólera o sol,
pelas chamas das velas subirei
quem sabe aonde?

Não quero mais viver os meus limites,
extrapolei de vez – melhor o fim,
abro as asas e, trapo de anjo do cortiço
e encontro no esquecimento alívio
deixando como último desejo
uma tocha com o sorriso da amada
espalhando cinzas do que restou dos sonhos
na entrada do meu túmulo vazio

sábado, 25 de junho de 2016

VESÚVIOS

Alegria guia magia
o fogo é uma jóia
da lágrima do olho celestial
vendo você tão mulher

todo querer completa a moeda
a imagem da amada
abre eternidades viris
quando metrópoles precipitam querubins temporários
nos matagais lancinantes
do sexo que só você imageneia
o delírio impõe
radicalidades orais
quando o rock é um deus teimoso
metalurgiando vesúvios
na busca da brasa permanente acesa na coroa do Amor
quando o grito que conta
sacudiu a única intimidade da petulância e do desfavor
aonde a sobra de alimentos é indigna
e o herói é um tipo criminal
eu nada mais tenho a fazer
mas singro os mares cravando velas gigantescas nos pontos cardeais
p'ra que a última declaração do meu Amor por você
faça ao mundo o sentido que um dia sonhei
pois sequer existo depois do Adeus que você me deu


Erico y Alvim

SUDÁRIO

velhas caminhadas e as novas
não dizem nada muito menos
quem é o quê

cigarro de palha enche o saco
maria fumaça é história
p'ra velho dormir
sonhando cara de boi

falo uma língua universal
mas a cara é sempre de chinês
porque o pó da estrada
é só uma letra de canção
saber a hora de partir
é viver odisseias pessoais

de hoje em diante
vago
sem outra bota
do que a de pisar fora
e apenas deixo lembrança
no papel amassado do bilhete breve
o eletrônico em mim
é o anjo que bateu asas
p'ra longe da loucura planetária
e caiu numa lua sem halo
aonde esquecer é pintar o sonho
no sudário


Erico y Alvim

quinta-feira, 16 de junho de 2016

SEXO & CIÊNCIA

As personalidades mais luminosas
da minha época dormem na calçada
entre a droga e o estelionato

Esta não é a terra receptiva
ao Anjo condenado a arrastar a sombra
colhendo as laranjas podres da estrada,
esta é uma terra de igrejas negras
- a monarquia réptil
cintila espadas lavradas dos ossos dos inocentes

Eu encontro a filha do negociante de cabeças
apaixonada pelo rei do tráfico
procurando entendimento e significado,
de ouvido colado no poço
esperando alguma notícia real/
aves descem-lhe docemente pelos suspiros

Por onde quer que eu vá
as pessoas trancam as portas
não querem presenciar
o cumprimento das promessas

O chacal crava a lança
no meio do horizonte, é hora
de encarar as possibilidades

As lágrimas de um anjo revoltado
com a escuridão das almas viciadas
materializam a mulher indecifrada
reinando no mundo baixo dos crimes
patrimoniais perpetuados nas escavações
religiosas cuja lógica é o encontro
do Universo com a modernidade

Rufam os tambores do Paraíso
os anjos de Atlântida
gritam nas celas
e a nova esotérica
é esquecida
porque sexo e ciência
dominam os sentidos

Eu não trago disponibilidades
a perfeição reside no esquecimento

 Erico y Alvim

quarta-feira, 15 de junho de 2016

ROCK HORROR SERTANEJO

Vejo os ventos estufando bandeiras execráveis
a rebelião é doce na tomada das ruas
nos devaneios,
a causa da desordem é que o novo verbo celeste
sai do sonho e caminha na poeira,
sei disso porque ouço os viajantes da noite
relatando as quedas

Conquistada a manhã
a cama tornou-se irreal,
e os poucos anjos preservados impunes
recolhem confissões dos amores imperdoáveis
despidos na aflitiva chegada
das manchas sonoras na lua

quando tudo enfim é uma gota gigante
do transparente mel escorrendo da colher marinha

quando tudo enfim é um trago antes da hora
antes de você antes de revelado o segredo

O vandalismo das viúvas
putri'vulvas
é um rock horror sertanejo
estátuas guerrilheiras de sobejo
sangram agruras heavy-esdrúxulas
aonde a revanche perdura

para que a nova elite surja da face lavada das rebeldias válidas

Eu sigo matuto sem regras
sonhando pântanos
aonde elementais dominam a noite
sei dos presságios
porque o crime vem do porão de Babel,
sei de mim porque só é definitivo o esculacho


Erico y Alvim

MENSAGEM FINAL

o canibal mastigava cérebros enlatados
ninguém mais sabe aonde os esqueletos jogam
eu quero só vomitar nas roupas das madames
porque velhotes babacas não servem de poetas
mesmo porque nas torres medievais nenhuma princesa
esperava sacanamente o ancião

aonde eu bebo a palavra é uma fenda no tabuleiro
e o fogo nunca foi memória nem tampouco mendigos clamam latim,
é preciso sabotar as escolas de pensamento
é preciso assassinar padres e riscar do mapa juramentos
é preciso deturpar a mensagem final
não sei porque desacredito em quem pede ajuda
há sempre uma conspiração no coração do fraco

não veja esta porcaria, há misticismos
aguardando depois da curva
não espere ditos as novidades encerraram
de agora em diante o que era só o testamento de um mito
virou escândalo e bebedeira no botequim fechado
de agora em diante quem espera o herói sobe o morro
nas costas o violão dos ossos do palhaço - lavrado


Erico y Alvim

QUANDO JAMAIS SERÁ PASSADO

do outro lado da noite/
o castelo de cartas/
do rei dos fracassados/
do submundo/
voa sonhos janela afora/
até desbotar ao sereno da lua/

qual é o gosto da demora?/
quem é o mestre vagabundo? /
o que há no anel do falso demente?/
atrás da máscara vigia o que entende/

a ética é só estética/
no trem o fantasma/
domina estranhamente/
aos que não reagem/
porque o jogo fim não tem//

o rogo é alecrim/
na ceia dos agiotas/
idiotas sósias  dos palhaços/
eletrônicos capachos das sombras//

nem um pouco tontas/
mergulhadas nas tintas/
das descomposturas lindas/
da queda do império aos impropérios//

quando jamais será passado/
quando só se quer o dia termine/
não importa quanto a esfinge/
o olhar incline //

devagar o crime/
ocupa o espaço do milagre/
aonde o galo canta metralha/
e o desprezo escangalha/
o poeta esmolando vocabulário de cabeça-de-bagre


Erico y Alvim

sexta-feira, 3 de junho de 2016

BRINCAR NA CONTRAMÃO

Eu fui embora calçando as sombras
que as saudades deixaram do que não resolvi,
as cordas q'eu dedilho são estradas
de cada loucura que me tirou daqui

Eu já brinquei no abismo de estrela cadente
e não me tornei melhor do que sou,
a subida oculta a verdade e ninguém sente
só na origem a pedra preciosa é puro amor

Brincar na contramão envelhece mais depressa,
ainda que o jovem gritasse era seco o eco
por mais que a andança n'algum lugar leve, essa
vontade de lutar é diferente, de noite - da chuva não seco

Aonde eu for encontro no mendigo
outro perdido do planeta rebelde,
o vento espalha em línguas de chamas o que eu digo
apenas porque o tempo é amigo de quem não cede 


Eriko y Alvym

quinta-feira, 2 de junho de 2016

RUAS DO ARCO-ÍRIS

1. Relembrarás
da longa e negra limusine
deslizando na lembrança
da aurora colorida pela canção,
quando a juventude era o caminho
da mudança, nas estradas
cuja poeira são acordes dos sonhos
que os anjos sacudiram do arco-íris
nascido das carnes do rock'n'roll
e do amor selvagem

2. Da voz nasce uma flor cujo perfume é ouvido
(é ouvido) na distância tirando faíscas dos átomos
relembrarás, oh sim, relembrarás
dos caminhos percorridos, dos caminhos percorridos relembrarás,
pedras em fogo rolando do motor, rolando do motor pedras em fogo,
e a multidão seguindo as pistas
apontadas pelas estátuas
guitarras rumo ao céu, céu das guitarras

3. Relembrarás, oh sim, relembrarás,
o amor universal fala pela canção,
e se aprendemos na liberdade
o som da terra e a língua do vento
aceleramos pelas estradas
atravessando de amor os campos selvagens,
pelas ruas do arco-íris chegando aos céus


Erico y Alvim

SANDICES

viajando solitárias trips,
o inferno é sempre o outro
e a saída distante,
sei bem qual o limite
do crime e castigo na roleta
porque tudo se resolve 
tendo calmante e um bom scotch,
você escorrega no meu talo
rebolativos precipícios relax,
sandices internáuticas desnudam 
a personalidade da face,
solitário viajante motocicleia
estupefatas macumbas
na estrada do castelo
aonde reina o esqueleto de um navegador,
e os cachorros uivaram
quando a que dá sentido à noite não veio,
e os bêbados choram nas praças
quando cavalos de olhos vermelhos 
levam embora os suicidas do amor,
e fantasmas selvagens
voltam em carrancas de fogo
reivindicando espirituais indenizações
de quem não sabe que matou

Erico y Alvim

terça-feira, 31 de maio de 2016

COMIDA ROUBADA

O que pode o homem rude e apaixonado/
que não cantar o blues e o rock'n'roll/
à moda das guerrilhas radicais da religião? //

Nesta cidade de sombras loucas/
a conspiração é real/
prefiro ficar que nem anjo desligado/
fumando baseado na chaminé apagada/
da fábrica falida/
aonde a minha alma queimada é um rasgo/
no céu que me escorre pelos dentes//

Política é lugar de santidade nenhuma/
por isso minha igreja é do rock'n'roll/
o direito urbano além do esconderijo/
é a comida roubada/
a cerveja é para o espírito assim como a espuma/
é a herança na vaidade do abestalhado//

Caçar é para ser de máscara/
do contrário tartarugas e lagartos/
desfilariam limusines nos carnavais/
por isso sigo você pelo telescópio da cobiça/
armado apenas de dentes e ostentação/
a moeda de troca é a foice do carrasco//

não desisto de você/
a escalada social/
é um compromisso de sangue e destino/
mas só o excesso é caminho da sabedoria/
porque nossas intensidades esgotam a noite/
quando mergulho estrelas/
nas suas carnes abertas em fúria


Erico y Alvim

NEM DA MÃE

É uma vítima da sociedade, 
rouba velhas, 
bate em mulheres

Droga arruma alguma sangue, 
trabalho coisa nenhuma 
navalha o sangue espuma

Sabe pedir sem favor 
nem da mãe recebeu amor 
toma do pobre p'ra enricar o doutor


Erico y Alvim

FUGIR DA LEI

Te amei como mendigo ama o lixo 
te roubei sem nenhum capricho 
o coração quando a loucura vier
Sua vida tão certa enterrei 
não quis saber se demônio ou rei 
só interessa morrer e fugir da lei
Pra repetir que não tenho pena 
quero aplauso cortando a cena 
o seu amor me dá força porque envenena


Erico y Alvim

PROIBIDO

Sobre uma bruma de mil cores/
você chega esparramando as torres/
num jardim pleno de delícias/
que em cada canto dança uma Vênus/
tirando véus do olhar/
mas você da alquimia bem-queria desterros/
de vizires abandonados de magias/
pisando seus pés as chamas de desejos/
que desmontam conspiratórias lendas/
na dança soprada pelo anjo no sonho dos profetas/
quando só as estátuas sabem a melodia do seu nome guardada nas estrelas/
pois é, aonde você passa a sombra levanta flor/
e se o proibido é uma norma de pedra/
não há segredo mudo na gaveta/
porque você ensina a verdade a voar pelo sorriso/
intensidade é uma prova que você existe/
se a beleza desalinha pela surpresa o luar


Eriko y Alvym





A NATUREZA É UMA CANÇÃO

Ao despertar, a Aurora cobria a Nudez
com as chamas que me faziam enxergar
a realidade das lendas. Ouvi
a tecelagem cancioneira das aranhas, e eis
que o indulto da miséria me permite
tirar dos olhos a venda
e a magia é plena.

Eu testemunhei a Aurora pingando dos seios
o orvalho brilhante que inebria
a adolescência da lucidez,
a Natureza é uma canção entoada
por todos os seres, o silêncio apenas
o sono da sensibilidade,
as pedras rumbam a magia eterna.

Ver-te Aurora é entender
na Sensualidade a curva
que desloca o sol
sobre a única nobreza humana:
o elo selvagem com o infinito
- o caminho do Éden
é pelo corpo amante 


Erico y Alvim

AURORA

Aurora, um dia na vida põe a eternidade no chinelo.
Anjo-pirata degola a certeza devorando alcachofras de fogo.
Através dos abismos festejados ela teceu teias de ouro
penduradas de frutos e armas alimentando a aventura cósmica,
ficar só no céu contraria os planos originais, somos busca,
o destino é outra história e não usa lendas nem assembleias.
Aurora desliza nas praias selvagens e mitológicas, vestida
no enigma, pelo enigma guarda ampulheta e cálculos secretos.
Aurora dedilha a harpa dos magos rasgando gotas de chuva
que despencam unicórnios e lobisomens-motorizados
sobre as superstições dos pastores sombrios – embasbacados
com joguinhos terápicos.
De onde ela chega, sabem apenas os que presenciaram
o erguimento mesopotâmico de uma terra ainda não-existente.
O anjo é anárquico visto da lógica da miragem.
Sagrada, a flor é completa como o sopro divino embaixo do mar,
e embora centúrias celebrem a queima dos barbarismos
levantando acordes dissonantes e machados místicos,
viver o mito se não revela o passado
fecha os cadeados das passagens secretas.
Resta apenas magia nas garrafas ocultas nas montanhas
trazidas dos céus em guerra, mas nada que assuste
a ninfa liberta do capuz da escuridão numa flor desabrochando
encantos lunares nas lagoas que iluminando a noite te revelam plena 


Erico y Alvim

MEU REDUTO

A arte livre
está morrendo,
restou apenas
esta caverna
p'ra te amar

A longa especulação
se instala,
o inquisidor
desenha sex'viagens
na prancheta

O céu avermelha
do sonho desfraldado
do anjo que navega
sobre caveiras,
sinos revoam morcegos

Harpas flamejam gritarias
aonde estátuas
mudam expressões
porque uma nova religiosidade
é centrada no amor despudorado

Ousarei outra aventura?
as muralhas erguidas
das pedras vindas da lua
não impedem o mar,
na chama eterna escrevo a despedida

certo de que só o amor
por ti a mim entregue
no bosque mágico
é a chave da outra vida:
lá, o teu lado é o meu reduto

o teu amor o levante do ser

Erico y Alvim

AS LINHAS DA MÃO VIRAM ESTRELA

O deserto de cristal
esparrama areias musicais
sobre o nosso gozo
de caçador e centaura
e entendemos
o ciúme é um anjo rebelde
- esqueleto do sonho

O amor é uma profecia
que deixa o sexo
aos números - brasas e agonia!
a bandeira tremula
inflada de gritos
e revelações
e nas areias cada gota de suor
é pérola colhida pelo demônio caolho

Cadê o sagrado?
levadas as vestes de cosmos
permanecemos com a flor intrépida
queimando e neste quadrado
solar cuja noite é uma pedra
tapando o sonho
a palidez do sol
perde o aborígene
para a TV

o homem que pintou
as paredes do céu
não pode ser cadáver
os anjos acendem nas velas
semibreves chamas de Adeus
e as serpentes urram
invadidas pela música

eu piso na brasa
com vontade
visto branco
porque o teu sexo
purifica na massagem
a minha síntese
pois as linhas da mão viram estrela
e o céu é outro

Erico y Alvim