quinta-feira, 4 de janeiro de 2018

MOTORISTA da LUA

É na rua que eu lhe vejo
sem-sentido mulher de avessos,
olhando a história do céu
você lembraria
do tempo que rebeldia
passava perto nossos caminhos.
Quando andávamos na lama
saber o percurso do sol fazia
a gente acreditar os ninhos
dos deuses estavam a ponto de cair
as leis do mundo seriam pregadas
por nossas mãos livres de correntes
e nem de longe suspeitávamos um do outro,
éramos viajantes e a estrada nosso espelho sem imagem

Tão fortes as certezas que o vento era nosso aliado,
tão fortes as certezas que a chuva regava nossas sementes,
tão longos os caminhos - nossos carros sempre a sair,
mas logo o mundo ficou real os caminhos eram sem rumo.

Quando você me vir de novo
saiba que eu sou outro,
acorrentado ao caminho errado
ando pelas ruas rasgado de frio
e não reconheço ninguém,
quando paro na estrada
é para ver que o tempo
me fez esquecer de mim,
guiar sob os mistérios da lua
é o destino dos perdidos
vou embora, sou dos viajantes
o que se despede dos sonhos
lavando o rosto no rio ao luar

a verdade crua
quando é dia sou apenas pó
de noite motorista da lua

domingo, 21 de agosto de 2016

ÚLTIMO DESEJO

Venham,
abandonem os carros no acostamento
e nas calçadas, atirem os dentes
e as carteiras no lixo, lamento
e delírio arrombem os cemitérios,
meu corpo permanecerá inerte
alegremente defunto

Meus olhos sirvam de lagoas podres
às borboletas, troquei a estrada
pela sombra, que o meu sangue
alimente os porres loucos dos mendigos
cansei de equilibrar na cólera o sol,
pelas chamas das velas subirei
quem sabe aonde?

Não quero mais viver os meus limites,
extrapolei de vez – melhor o fim,
abro as asas e, trapo de anjo do cortiço
e encontro no esquecimento alívio
deixando como último desejo
uma tocha com o sorriso da amada
espalhando cinzas do que restou dos sonhos
na entrada do meu túmulo vazio

sábado, 25 de junho de 2016

VESÚVIOS

Alegria guia magia
o fogo é uma jóia
da lágrima do olho celestial
vendo você tão mulher

todo querer completa a moeda
a imagem da amada
abre eternidades viris
quando metrópoles precipitam querubins temporários
nos matagais lancinantes
do sexo que só você imageneia
o delírio impõe
radicalidades orais
quando o rock é um deus teimoso
metalurgiando vesúvios
na busca da brasa permanente acesa na coroa do Amor
quando o grito que conta
sacudiu a única intimidade da petulância e do desfavor
aonde a sobra de alimentos é indigna
e o herói é um tipo criminal
eu nada mais tenho a fazer
mas singro os mares cravando velas gigantescas nos pontos cardeais
p'ra que a última declaração do meu Amor por você
faça ao mundo o sentido que um dia sonhei
pois sequer existo depois do Adeus que você me deu


Erico y Alvim

SUDÁRIO

velhas caminhadas e as novas
não dizem nada muito menos
quem é o quê

cigarro de palha enche o saco
maria fumaça é história
p'ra velho dormir
sonhando cara de boi

falo uma língua universal
mas a cara é sempre de chinês
porque o pó da estrada
é só uma letra de canção
saber a hora de partir
é viver odisseias pessoais

de hoje em diante
vago
sem outra bota
do que a de pisar fora
e apenas deixo lembrança
no papel amassado do bilhete breve
o eletrônico em mim
é o anjo que bateu asas
p'ra longe da loucura planetária
e caiu numa lua sem halo
aonde esquecer é pintar o sonho
no sudário


Erico y Alvim

quinta-feira, 16 de junho de 2016

SEXO & CIÊNCIA

As personalidades mais luminosas
da minha época dormem na calçada
entre a droga e o estelionato

Esta não é a terra receptiva
ao Anjo condenado a arrastar a sombra
colhendo as laranjas podres da estrada,
esta é uma terra de igrejas negras
- a monarquia réptil
cintila espadas lavradas dos ossos dos inocentes

Eu encontro a filha do negociante de cabeças
apaixonada pelo rei do tráfico
procurando entendimento e significado,
de ouvido colado no poço
esperando alguma notícia real/
aves descem-lhe docemente pelos suspiros

Por onde quer que eu vá
as pessoas trancam as portas
não querem presenciar
o cumprimento das promessas

O chacal crava a lança
no meio do horizonte, é hora
de encarar as possibilidades

As lágrimas de um anjo revoltado
com a escuridão das almas viciadas
materializam a mulher indecifrada
reinando no mundo baixo dos crimes
patrimoniais perpetuados nas escavações
religiosas cuja lógica é o encontro
do Universo com a modernidade

Rufam os tambores do Paraíso
os anjos de Atlântida
gritam nas celas
e a nova esotérica
é esquecida
porque sexo e ciência
dominam os sentidos

Eu não trago disponibilidades
a perfeição reside no esquecimento

 Erico y Alvim

quarta-feira, 15 de junho de 2016

ROCK HORROR SERTANEJO

Vejo os ventos estufando bandeiras execráveis
a rebelião é doce na tomada das ruas
nos devaneios,
a causa da desordem é que o novo verbo celeste
sai do sonho e caminha na poeira,
sei disso porque ouço os viajantes da noite
relatando as quedas

Conquistada a manhã
a cama tornou-se irreal,
e os poucos anjos preservados impunes
recolhem confissões dos amores imperdoáveis
despidos na aflitiva chegada
das manchas sonoras na lua

quando tudo enfim é uma gota gigante
do transparente mel escorrendo da colher marinha

quando tudo enfim é um trago antes da hora
antes de você antes de revelado o segredo

O vandalismo das viúvas
putri'vulvas
é um rock horror sertanejo
estátuas guerrilheiras de sobejo
sangram agruras heavy-esdrúxulas
aonde a revanche perdura

para que a nova elite surja da face lavada das rebeldias válidas

Eu sigo matuto sem regras
sonhando pântanos
aonde elementais dominam a noite
sei dos presságios
porque o crime vem do porão de Babel,
sei de mim porque só é definitivo o esculacho


Erico y Alvim

MENSAGEM FINAL

o canibal mastigava cérebros enlatados
ninguém mais sabe aonde os esqueletos jogam
eu quero só vomitar nas roupas das madames
porque velhotes babacas não servem de poetas
mesmo porque nas torres medievais nenhuma princesa
esperava sacanamente o ancião

aonde eu bebo a palavra é uma fenda no tabuleiro
e o fogo nunca foi memória nem tampouco mendigos clamam latim,
é preciso sabotar as escolas de pensamento
é preciso assassinar padres e riscar do mapa juramentos
é preciso deturpar a mensagem final
não sei porque desacredito em quem pede ajuda
há sempre uma conspiração no coração do fraco

não veja esta porcaria, há misticismos
aguardando depois da curva
não espere ditos as novidades encerraram
de agora em diante o que era só o testamento de um mito
virou escândalo e bebedeira no botequim fechado
de agora em diante quem espera o herói sobe o morro
nas costas o violão dos ossos do palhaço - lavrado


Erico y Alvim